segunda-feira, 20 de agosto de 2012

A TRILOGIA - Prefácio


Este é um livro irreverente, haverá quem diga: ‘satânico’. Fala de individualidade e autodescoberta, mesmo que estas importem em afastar-se dos demais, esmiuçar a vida por conta própria e cometer crimes. O protagonista Renato Daemon é um escritor que resolve morar nele mesmo, e não o faz sem passar por descobertas assustadoras e mesmo avassaladoras, no intuito de incorporar sua sombra como fonte de poder. Fazer isto não é para qualquer um, requer uma atitude destemida que obviamente desagrada aqueles que têm uma leitura de mundo bastante simples, os comuns. Ele seguirá em frente, fazendo desta descoberta sua arte e confrontando este novo mundo com o mundo confortável das pessoas corriqueiras, levando isso às últimas conseqüências. Um homem solitário e corajoso que receberá o epíteto de ‘monstro’, por negar-se a refletir os comportamentos aceitos e o pensamento estagnado que aquece os acomodados e até legitima essa inércia. Mas, nem todo mundo é todo mundo, e a mim parece que esta é a equação mais difícil de resolver na cabeça da chamada ‘maioria’. O pensamento gregário reluta em aceitar a originalidade, - vide a Arte - como se esta fosse fazer desmoronar o castelo de areia que foi construído com tanto esmero e paciência para que sirva de abrigo àqueles que não tem coragem de arriscar.  A vida é muito curta e preciosa para nos darmos ao luxo de alguma vez não saltarmos na vastidão negra de nossos abismos mais profundos, mesmo que lá nosso rosto assuma feições demoníacas. Mas, afinal, a quem interessa que não realizemos essa viagem fantástica da autodescoberta? Até mesmo ameaçando-nos com noções de inferno? Deixo a pergunta no ar.  Será mesmo que os arautos da Moral, aqueles que se beneficiam com ela, não possuem vãos escuros na chamada alma? Hmmm...  Bem, Rio Cercado, a cidade onde se desenrola esta estória, é uma localidade acomodada e corriqueira, que tem seu amado sossego quebrado quando percebe que o ‘outro’, o ‘invasor’ é ‘diferente’. A autonomia é algo perigoso aos acomodados e tem de ser, ou não é nada! Sendo planificada – a cidade - e  horizontal em comportamento, é logicamente acéfala [o fato de não ter um prefeito, ou, que este seja irrelevante na história, demonstra isso], porém, o inusitado faz com que algumas nuances humanas se desvelem, e alguns rostos apareçam por detrás das máscaras. Ficar agarrado ao lado apolíneo, desprezando e anatematizando, sempre, as deliciosas artes de Dionísio, só pode gerar pessoas pela metade. Pois bem, que cada um enxergue, então, até onde esse sol de Apolo alcance, e que seja um perigoso abismo o que for para mais além. Mas que nunca se esqueçam: existem  seres que carregam imensos abismos dentro de si, que brincam com luz e escuridão com a habilidade dos mestres! São os ‘diferentes’...  os diferentes dos chamados ‘bons’. O ‘bem’ é um rótulo que abriga todo tipo de hipocrisia, e é sob essa égide, e forçação de barra platônica, que toda uma canalhice existencial se esconde, e a História não nos deixa mentir: Sade nunca matou ninguém, mas era o libertino ‘mau’, já o ‘bom’ Robespierre... [...e não estou emitindo juízo moral aqui, só demonstrando quanto se pode ser hipócrita conforme as circunstâncias]. Pois é... é tudo uma questão de perspectiva [mais uma vez, dá-lhe Nietzsche!]. Bem e Mal são conceitos manobrados de acordo com o momento histórico e as conveniências, nada mais; porém, servirão sempre como esconderijo para todo tipo de gente. Quem não pode criar-se a si próprio, abriga-se sob as coisas e conceitos criados, paciência, mas isso não torna ninguém ‘melhor’, ah, isso não. Um homem versus a Cidade, a Cidade versus um homem, taí uma luta justa, o mau Renato Daemon contra a boa Rio Cercado e vice-versa, que cada contendor use as armas de que dispõe, da maneira que melhor lhe convier.     Enfim, espero que as pessoas inteligentes entendam as metáforas contidas neste livro, as demais, gostaria que ficassem longe dele, pois não faltariam acusações ao autor, tipo: tem uma mente psicopata! Mas... pensando bem, até que isso seria divertido, então a esses eu responderia... ou melhor... seria mais divertido, também, deixar esta resposta no ar...

 

 

 

 

                                                                                                           Roberto Axe

 

                     Porto Alegre, 17 de outubro de 2009.