A fera se deliciava. Aquela carne fresca, todo aquele sangue. A escuridão
segura daquele porão... e o cheiro cúmplice da morte. Apenas a pequena vela em
um canto do recinto emprestava seu fogo dançante à cena macabra. A mulher,
sentada nua no chão, em um canto, imersa naquela sombra tão confortável e
mansa, observava a pantera em seu regozijo. Uma observadora serena em sua
excitação calma, embalada por uma lascívia etérea e crescente. Observava atenta
seu animal destrinchar com volúpia e cuidado aquele corpo morto de homem que
agora mais parecia o de uma boneca de pano na submissão àquela força
ferina. Casualmente a cabeça da presa,
que pendia inerte apenas ligada por tendões e músculos teimosos, mantinha os
olhos abertos em direção à mulher, como que pedindo uma explicação para o porquê daquela morte tão prematura e
violenta de que agora era vítima. A pantera lambia ossos expostos num cuidado
zeloso pelo alimento; de tanto em tanto, parava e olhava diretamente nos olhos
da dona, numa cumplicidade só possível nas sombras. – Come, meu amor, come... –
disse a moça, levando calmamente a mão à sua boceta totalmente molhada; sentiu
no esperma do morto, que caia lento da vagina inchada, a reminiscência viva do
coitado. O que dele ainda era vivo estava nela. Uma sensação de poder e gozo
lhe assaltou de supetão, ela conhecia muito bem aquele sentimento delicioso que
agora se apossava de sua pele. Seu rosto foi tomado por um calor de quarenta
graus, e ela começou a emitir gemidos; seu corpo começou a tremer e a esquentar
numa sensação febril e incontrolável. Puro prazer. Manuseava o clitóris com
sofreguidão e a pantera em consonância emitia pequenos grunhidos oriundos do
deleite daquela carne morta e suculenta. A luz do tímido fogo da vela clareava
com seu amarelo indeciso, o chão enegrecido em torno do banquete da besta. Era
um sangue denso e aquele cheiro, ali, naquele ambiente tão pequeno, a qualquer
um causaria fortes náuseas, mas não a ela. Ela não. Ela não era mais qualquer
um. E uma risada explodiu ruidosa; seu corpo tremeu inteiro assolado por um
prazer incontido e puramente carnal... um prazer de fera! Retirou a mão de sua boceta, que se transformara
em uma suculenta flor desabrochada pelo calor do instinto, e botou na boca.
Lambeu seus dedos com todo aquele líquido pastoso, produto de sua excitação
desenfreada misturado ao sêmen do morto, e não agüentando mais, deu início a um
gozo alucinado, e enquanto lambuzava com os dedos sua boca e seios, a outra mão
trabalhava, frenética, em seu clitóris, este parecia que iria explodir um
prazer selvagem a qualquer momento, levando através de um rastilho de fogo, o apoteótico
orgasmo ao fundo de seu útero. A pantera pressentiu o êxtase da mulher e na
cumplicidade daquela escuridão, rugiu com força, mais de uma vez, fazendo com
que seu hálito quente de sangue chegasse àquele corpo vivo que se contorcia,
febril, em seu canto; então os gritos e os rugidos se misturaram num amalgama
de êxtase cego.
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