terça-feira, 9 de abril de 2019

A PANTERA DO PORÃO - Prefácio


Amanda sempre foi uma mulher insegura. Influenciada pelas implacáveis opiniões alheias e vivendo intimidada pelo olho do outro, tenta compensar seus fracassos amorosos através de algum sucesso profissional.  Ao mudar-se para a nova casa, talvez exageradamente grande para suas necessidades, faz uma descoberta surpreendente ao encarar alguns de seus medos e finalmente entrar no porão da residência. Tinha medo de porões. Mas ao descer ao obscuro local, faz uma descoberta bizarra e que mudaria totalmente os rumos de sua bem organizada, porém infeliz vida. Ao penetrar nos recônditos mais escuros e assustadores de onde mora e ao meso tempo em seu próprio ser, vislumbra uma nova perspectiva, um novo mundo, que lhe fascina; no entanto, para seguir por esse caminho terá de pagar um preço. Uma estranha alegria vai aos poucos tomando corpo, e algo sinistro age no íntimo de Amanda numa misteriosa mistura de êxtase e sensação de segurança nunca sentida até então. O preço a pagar não importa, desde que possa prosseguir sua trilha rumo ao desconhecido, que aos poucos, passa a compreender e desejar ardentemente. Enfim, uma nova vida em que o tempo de humilhações e inseguranças do passado não tem lugar. Agora, uma mulher resolvida e sedutora assume as rédeas, e o mundo passa a ser um playground para seus novos desejos e caprichos. Sangrentos caprichos...
A mais louca aventura sempre se dá dentro de nós mesmos, e os labirintos que nos esperam são feitos de negros abismos. A jornada é assustadora, mas gratificante. O autoconhecimento se dá em meio a um rebuliço promovido pelas mais estranhas figuras e os mais tenebrosos sentimentos; uma festa diabólica e disforme em que só os muito determinados conseguem encarar. A protagonista encarou. Daí em diante tudo passa por tomadas de decisões, uma vez que a moral que seve para todos já não serve para o aventureiro das trevas. É preciso agora moralizar, tomar decisões, fazer as coisas por conta própria, assumir-se, ser o que é. O famigerado olho do outro já não tem poder, já não diz nada, passa a ser platéia, nada mais. As ameaçadoras forças externas se tornam risíveis, patéticas, débeis. O turbilhão que floresce ruidoso nas entranhas do aventureiro, traz das profundezas pantanosas o poder da mudança, uma poderosa mudança; caberá sempre a cada um decidir o que fazer com ela. Amanda decidiu. Se para o bem ou para o mal é outra história, até porque esses conceitos tão repisados caem por terra, já não podem nada, são estéreis diante da nova moralidade do viajante sinistro. Ao descobrir a besta que dormia na escuridão e tomar a decisão de alimentá-la, ou seja, não deixá-la morrer de inanição, Amanda toma um rumo que é só seu e assume os riscos que por ventura decorram daí. É um primeiro passo, um novo caminho, e exige coragem, as grandes decisões exigem coragem. Haverá as recompensas e os gozos, assim como os devidos cuidados. A decisão de ir para o lado marginal e proibido da vida é um divisor de águas, não terá volta, é o caminho brutal que leva ao inferno, que a essa altura é uma espécie de paraíso das delícias para quem se transformou em fogo! A sedução da cobra só é aprendida por quem tem coragem de freqüentar seu ninho. Amanda teve. E a primeira lição é simples: se você não quer ser picado pela serpente, transforme-se em uma.  
Dito isto, quero ressaltar que este é um livro violento e não recomendável para espíritos mais delicados, sempre faço questão de alertar para isso. Um amigo me perguntou certa vez por que eu pego tão pesado. Respondi que é o jeito de eu produzir minha arte. Seria como pedir, guardadas as proporções, para Tarantino escrever o roteiro e dirigir um musical romântico. Cada um na sua. Se sexo e violência estão presentes em minha obra é porque são absolutamente necessários para a compreensão do contexto que quero expor. Felizmente tenho recebido mais elogios do que críticas. Sendo assim, e tendo avisado o caro leitor(a) do que virá pela frente, só resta desejar uma boa leitura e reflexão sobre o exposto nesta obra. Como disse antes, a viagem às trevas exige coragem, e se tudo for bem observado e percebido durante a tenebrosa trajetória nas sombras, com certeza então terá valido a pena. Aqui não é proibido pegar uvas ao passar pelo parreiral. Pelo contrário. E se resultar em bom vinho, melhor ainda. Dionísio agradece. Boa aventura!




                                                                                               Roberto Axe


Porto Alegre, 10 de março de 2019.

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